quinta-feira, 31 de maio de 2012

Considerações sobre o ônibus e a filosofia da cordinha


Não era só uma cordinha de ônibus, seus aproximados 5,4m de comprimento estavam ali com um minúsculo propósito: parar.
Lá estava ela e a sua aparente insignificância diária, cheias de micro cordinhas entrelaçadas, unidas, formando uma corda maior e consequentemente dificultando a quebra. Parece até aquela coisa de “juntos venceremos”, principalmente se tratando do lugar onde se encontra: o ônibus.
“Ô.ni.bus Subst. Masc. 2 núm. Veículo automóvel para transporte público de passageiros [...]” assim define o dicionário Aurélio. E põe passageiros nisso!
Aquele grande treco cheio de mobilidade pode carregar trilhões de pessoas... E quando eu digo trilhões é claro que eu estou exagerando, mas sinceramente, às 7h da manhã, quem pega ônibus para trabalhar vai ter essa mesma impressão; logo, são “trilhões de pessoas” puxando a corda, sentando e levantando o tempo inteiro com uma cara de sono de dar dó, se esfregando uns nos outros, apertados como em uma lata de sardinha e chegando ao seu destino gotejando de suor.
Apesar de ser detestável circular por aí de ônibus, todos podemos evoluir como seres humanos dentro dele exercitando a paciência com o próximo. Quando não é alguém vestido de palhaço te dando o bom dia mais desgraçadamente feliz do universo pedindo alguns trocados (detalhe: eu acordo de mau humor), é uma criança chorando desesperadamente e incessantemente no colo da mãe que pouco faz questão de acabar ou pelo menos amenizar o choro do filho.
Hoje me deparei com um sujeito engraçado no ônibus, era um rapaz que aparentava ter trinta anos. Um tanto arrumado, cabelo engomado, sapato engraxado e roupa social (o crachá do lugar onde trabalhava balançava em seu pescoço e não escondia seu nome nem sua função), tinha a cara de executivo e suas mãos estavam escondidas dentro do bolso. Após sua entrada, o ônibus acelerou, e as suas mãos ainda sim permaneciam no bolso, quando ousava retirar, parecia evitar ao máximo tocar em qualquer lugar do veículo e se apoiava com as costas, com os cotovelos ou mesmo com os ombros. A dificuldade em se equilibrar sem usar os membros superiores era um desafio exaustivo, o que era perceptível no suor que escorria em sua testa e nas manchas umedecidas já visíveis em sua camisa, mesmo assim, as mãos permaneciam lá, dentro do bolso, imóveis.
Todos dentro do ônibus haviam notado sua postura e olhavam para ele com o mesmo desdém que ele olhava os demais, era notório que ele tinha nojo do ônibus e tinha certo receio com relação às pessoas que nele estavam. Pensei que talvez ele fosse um daqueles maníacos por limpeza que pensa que suas bactérias são mais nocivas e menos contagiosas que a de qualquer outra pessoa.  Perguntava-me a todo instante como ele faria para puxar a tão inevitável cordinha e indicar que deseja descer do ônibus sem usar as mãos. Não saciei minha curiosidade, desci do ônibus antes que ele completasse o seu trajeto.
Andar de ônibus tem sido assim: muita gente estranha, muito estresse, muito aperto... MUITO no seu mais alto nível de intensidade. Se às 7h da manhã foi assim, imaginem a volta para casa às 18h.
O ônibus atrasou 40min do seu horário de chegada e mais uma vez chegou lotado. Eu quase não conseguia segurar em algum apoio, o vento mal circulava, as portas rangiam toda vez que se abriam, as cadeiras mesmo riscadas e desconfortáveis eram acirradamente disputadas e a catraca nunca (eu disse NUNCA) parava de girar.
O som agudo e repetitivo da cordinha do sinal era o aviso de que o motorista sem dó de nenhum de nós faria uma brusca freada no ponto mais próximo jogando-nos uns contra os outros, como em um liquidificador.
Parei para analisar a cordinha do ônibus (sim, eu parei em meio aquele inferno todo). Ela e toda a sua aspereza talvez significassem mais que o óbvio de todos os dias.
Uma pessoa me disse uma vez que as coisas ficam mais bonitas quando damos sentido a elas. Assim, eu dei sentido a cordinha e fiz uma analogia com as escolhas que fazemos, representando-as pelos pontos de ônibus distribuídos pela cidade; a cordinha representaria a decisão das escolhas e eu, o que move a decisão.
É preciso parar na escolha certa, frear naquilo que a felicidade pede pra decidir e mesmo que os obstáculos, conflitos e estresses (representados pelo ônibus) queiram mudar o foco, o que te faz melhor é ter a certeza de que se continuar sem desviar e a sua escolha for correta, você pode se realizar com a opção escolhida.
Todos os dias opções nos são apresentadas. Cabe a nós decidir sobre elas e puxar a cordinha de parada (talvez possamos parar na escolha que nos leve além), mesmo que para isso tenhamos que pegar alguns ônibus lotados no meio do caminho, porque deixar as coisas mais bonitas não é fazer com que as dificuldades protagonizem a nossa vida, e sim, fazer das barreiras um detalhe.  

Cinthia Machado
Larissa Porto
Eliakim Batalha